sexta-feira, dezembro 09, 2005

A VIAGEM DE UM LOUCO V de X

Risca as palavras capazes de lhe revelar o segredo. Três camisas, um lápis, um teclado e muitos livros para ler em voz alta nas horas fantásticas da noite. A cidade ilumina-se em geometrias incompreensíveis, espreguiça-se pelas avenidas periféricas... cette putain de ville. A viagem é uma predisposição. Temos de deseja-la e prepara-la cuidadosamente. Viajar sem sair do quarto. As malas arrumadas junto à porta. Ao fim de uma hora reabre-as e repõe as coisas nos seus lugares. Basta fingir que está a chegar. O horror de pensar que uma vida tão jovem, e que de entre todos os seus defeitos tinha ainda promessas de beleza, acabaria de forma tão revoltante. Fabricou amor a partir do zero. E pensou ter encontrado alguém que entendesse o amor como partilha absoluta. No entanto a infeliz fraqueza que a caracterizava, o desejo ingrato e infantil, o sorriso tão meigo quanto sarcástico está entranhado na estagnação do cheiro da areia ensanguentada e das algas esmagadas. O louco dorme sobre a sua almofada.

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