segunda-feira, março 01, 2004

THE LAST TIME

Recua comigo...
Era uma vez, há muito tempo, nesta mesa, onde tudo começou. Lembras-te?
Agarrei-te na perna e sacudiste-a para não me sentires; para não te chegar o que sentia.
(Acreditem... Não se riam...)
Eu estou aqui. E aquela onde estou sentado não é uma cadeira. É uma fábrica de fazer sonhos.
E tu? Como te chamas? Não és daqui pois não?
... E descobri. A história é tão simples como a cor dos teus olhos. Acredito que esta história começou aqui, neste mobiliário urbano de cor verde, plantado numa das sete colinas de Lisboa.
Para sempre fixei as tuas costas, a tua nuca e ainda hoje ouço o som da porta fechar-se. Penso que a terra e este céu também o sentiram. Por tua causa, vã glória de inspiração, o mundo apagou-se e a causa ruiu.
Para sempre julguei eu. Porque me entreguei como num fim, já sem corpo e perdido na pintura e na escrita exagerada das formas, que caricaturavam um mundo que já não compreendia... percebi depois... que em mundos vários, génios incertos e palavras vazias, que se espelham em todos os lagos, rios e mares do universo, há mil e uma formas de dizer sempre o mesmo, da lógica ao sentimento, pensando com razão o que se sabe na alma e se escreve no coração.
Durante muito tempo revi esse dia. Chegava-me sem eu o prever, sem eu o procurar. As pinturas transformaram-se, tornando o denso leve e o vazio cheio. No peito rebentaram as chagas que queimavam por dentro. Das paredes emanaram palavras que não são ditas por ninguém. Nos livros ouviam-se vozes que se empenham em experimentalismos e em levar ao extremo as sensações, podendo ter consequências sísmicas sem ser essas as suas intenções. Objectos de desejos. Objectos de prazer. Objectos que agradam ao olhar e dão um toque quente e acolhedor ao ambiente. Passaportes para viagens inesquecíveis... tal como esta musica que oiço... esta que me chega de um futuro que não vivi.
Foi assim, tal e qual.
E, sei lá porquê, cansei-me. Rendi-me e entreguei-me a mim próprio. Lembro-me bem da luz. Era a suficiente para me orientar no emaranhado de jazigos até chegar à cova aberta. Debrucei-me à beira dela. Era muito funda. Larguei a flor. Descrevendo pequenas espirais a flor lá foi caindo e acabou por bater no caixão. Apesar de tudo era um espelho que apresentava o EU a mim. Agarrou-me pelos estilhaços e colocou-os sobre a mesa verde, onde tossi as entranhas, tossi a alma, até que finalmente acabei por adormecer.
(Não tenhas medo, sem ti (EU) nada terias sentido, nem sequer a ilusão de um dia teres amado absolutamente)
Pode sempre explicar-se o drama de uma vida através de uma metáfora. Mas, nunca (*) "pensar que, um dia, tudo o que se viveu se há-de repetir, ainda, uma e outra vez".

Hoje foi irrevogavelmente a ultima vez.

(*) In Insutentável Leveza do Ser

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